No País dos Arquitectos é um podcast criado por Sara Nunes, responsável também pela produtora de filmes de arquitetura Building Pictures, que tem como objetivo conhecer os profissionais, os projetos e as histórias por trás da arquitetura portuguesa contemporânea de referência. Com pouco mais de 10 milhões de habitantes, Portugal é um país muito instigante em relação a este campo profissional, e sua produção arquitetônica não faz jus à escala populacional ou territorial.
Neste episódio Sara conversa com Bruno André e Francisco Salgado Ré, do estúdio criativo AND-RÉ, sobre o Centro de Artes de Águeda. Ouça a entrevista completa e leia parte da transcrição da conversa, a seguir:
Sara Nunes - Há uma coisa que me chamou a atenção na descrição do projecto sobre o qual vamos estar a falar hoje, que é o Centro de Artes de Águeda. Vocês falavam que este edifício simbolizava uma nova forma de estar na arquitectura e na profissão. Gostava que vocês explicassem um pouco melhor isso. Começava pelo Francisco.
Francisco Salgado Ré - Simboliza a escala, dado o contexto e dados os desafios. Nós somos de uma geração que conhece bem estes desafios em que toda a nossa prática foi levada a cabo a trabalhar com eles. Este caso, em particular, é bastante simbólico esse desafio, dado pelo contexto económico e também pelo contexto político... pela forma que nós temos de encontrar novas soluções, de ser criativos na procura de resoluções a problemáticas que anteriormente não existiam, de trabalhar em equipa, de ver a arquitectura de uma forma muito mais abrangente do que era anteriormente.
SN - Uma das coisas que é impossível ficar indiferente, neste projecto, é a enorme chaminé em tijolo burro, que se destaca no edifício, embora deixe uma marca também no próprio edifício. Vocês poderão falar também melhor sobre isso. Sinto que essa chaminé conta a história de uma memória anterior ao edifício. Podem contar-nos um pouco sobre esta história do lugar, André?
Bruno André - Sim, exactamente. A preexistência e a história fabril da região de Águeda fica um bocadinho na memória colectiva de toda a gente com esta representação com o elemento mais icónico que é a chaminé. Naquele local existia uma unidade fabril de uma escala considerável e que já tinha sido demolido há muitos anos e que a chaminé sempre ficou como memória desse passado.
SN - Já agora, era uma unidade fabril de quê? Sabe?
BA - De cerâmica... Tijolo, telha, que é um bocadinho histórico daquela região. E, aliás, deixamos a chaminé, deixamos um muro da envolvente, que também estava executado em telha preexistente. Houve alguns elementos históricos que nós fizemos por manter no contexto, apesar de que a chaminé estava logo na imposição no início do concurso e achámos que haveria uma melhor forma de a integrar. A nossa ideia foi, sem dúvida, mantê-la e que ela tivesse, até, algum impacto, alguma ressonância no próprio edifício, por isso é essa forma da própria chaminé que se imprime na fachada do edifício.
SN - Sim. Ela recorta o edifício, não é?
BA - Exactamente. E por isso era uma exigência, mas, por outro lado, nós achámos que essa exigência era quase um elemento que não deveria ser considerado como acessório, que estivesse ali à parte. Pretendíamos que se percebesse que a chaminé impactava o edifício e, principalmente, impactava a organização formal, assim como a implantação do edifício porque também é ela que marca a praça que dá a chegada ao edifício e cria uma hierarquia de percursos e de chegada.
SN - Que funções é que o Centro de Artes alberga? Porque não estamos aqui a falar apenas de um museu... E pergunto também de que forma é que vocês deram forma a essas funções do edifício?
FSR - O Centro de Artes de Águeda não é só um museu. Aliás, o seu coração está provavelmente no auditório. É uma sala de espetáculos multidisciplinar e capacitada com volta de 600 lugares, onde tem várias infraestruturas de apoio. Isto se calhar fazendo também uma ligação com a primeira pergunta de como é que nós nos posicionamos, hoje em dia, perante a arquitectura. É também tendo um espírito crítico sobre o programa, sobre o lugar e sobre a praxis em si. Neste caso, o desafio foi, essencialmente, inicialmente económico. O budget disponível era manifestamente insuficiente para fazer um programa daquele tipo com as condições e necessidades técnicas que um auditório tem... e de mais espaços adjacentes... mas conseguir embrulhar isto tudo numa solução que fosse não só funcional, mas que ultrapassasse, em termos de ambições, as fronteiras e os limites do próprio edifício. Que os edifícios consigam ter um impacto que vai para além da sua forma, que consigam impactar a cidade e que, por sua vez, possam atrair públicos e tornar a cidade um espaço melhor. Neste caso, isto faz-se com uma atitude crítica em relação ao próprio programa, à forma como ele se articula, mas também à forma como o edifício se articula com a cidade. A sua implantação, como o Bruno estava a dizer, cria uma praça que abraça e que se abre à cidade, criando acontecimentos e criando dinâmicas que poderiam não existir.
Ouça a entrevista completa aqui. Reveja, também, as entrevistas já publicadas do podcast No País dos Arquitectos:
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Nota do editor: A transcrição da entrevista foi disponibilizada por Sara Nunes e segue o antigo acordo ortográfico de Portugal.